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Testemunhos: Post-LASIK

Testemunho de L. (Portugal) 

Desde Abril de 2003, na sequência da operação para correcção da miopia (LASIK) comecei a ter problemas de secura ocular, erosões recorrentes na córnea e queratites em ambos os olhos, tendo a situação piorado significativamente em Novembro do mesmo ano. 

A decisão sobre a operação Lasik foi tomada com base numa motivação pessoal e na opinião de três especialistas distintos, para os quais eu seria, à partida, um caso simples quer para a operação quer para o uso de lentes de contacto, as quais sempre recusei pois pensar na “logística” associada causava-me, desde logo, desconforto mental.  

Contudo, durante a operação o epitélio das córneas de ambos os olhos ficou com uma grande lesão, em especial no olho esquerdo, para o qual se estimou um tempo de recuperação de meses. Foram-me colocadas lentes de protecção. Nessa altura o meu processo de cicatrização foi lento, tendo formado pequenas estrias e cicatrizes superficiais que com o passar de semanas foram melhorando e, consequentemente a própria visão. O tratamento baseou-se numa hidratação agressiva. Durante essa fase eu retomei o meu trabalho e apesar do mal-estar consegui continuar a trabalhar esforçando os olhos em termos de permanência ao computador e em escritórios “inteligentes”, nos quais o ar condicionado é um facto incontornável.

 Na Primavera, comecei a ter alergias nas pálpebras e inflamações nos olhos, situação que nunca tinha tido. De facto, eu nunca tive problemas nos olhos, a não ser o que julgo comum para a maioria das pessoas que trabalha várias horas num computador e nos ditos escritórios “inteligentes”, ou seja, ardor e cansaço ocular no final do dia. Nessa altura, comecei a acordar durante a noite com uma dor funda, a qual durava cerca de 10 a 15 minutos e estabilizava deixando a sensação de corpo estranho, picada ligeira a média quando pestanejava e uma sensação de olho dorido. A qualidade de vida começou a ser afectada em termos sociais, comecei a restringir espaços com tabaco, idas à esplanada ou passeios em dias de algum vento, para além do efeito de estar sempre com um grande desconforto nos olhos que me impossibilitava estar descontraída mesmo nos tempos livres.

O tratamento consistiu em hidratação agressiva e anti-histamínicos.

Em Agosto, estive de férias e comecei a melhorar, ao que não consigo atribuir uma só causa, mas julgo que vários factores poderão, no seu todo ou em parte, ter influenciado positivamente a minha recuperação: tamponamento temporário do canal lacrimal inferior de ambos os olhos, descanso total do computador e de espaços muito agressivos, tratamentos de acupunctura e fitoterapia, e hidratação dos olhos durante mesmo durante a noite (em finais de Julho comecei a acordar de noite em intervalos de 2,5 horas). 

Em Setembro sentia-me melhor mas voltei a fazer umas 3 a 4 pequenas lesões no epitélio após o regresso ao trabalho, situação que estabilizou após umas semanas. Quando digo, estabilizar significa não fazer lesões, contudo mantinha os cuidados com a hidratação constante (de hora a hora ou menos conforme os dias) e mesmo durante a noite em intervalos de 3 horas, bem como a restrição da frequência e permanência em determinados locais públicos, o que condicionava cada vez mais a vida social. 

Passado um mês e meio, por motivos profissionais fui para um projecto no qual tive que viajar com regularidade de avião, não tendo nenhum médico desaconselhado (à excepção dos médicos /técnicos de acupunctura) que eu aceitasse o mesmo. Ao longo do mês no projecto, tive sempre cuidados com a hidratação e durante as viagens de avião colocava sempre compressas de água fria nas pálpebras como uma tentativa de criar um ambiente húmido. No final de Novembro comecei a fazer pequenas lesões nocturnas, voltei para Portugal, tendo o meu médico constatado que eu tinha perdido os tampões temporários, voltaram a colocar outros tampões, mas ainda nessa mesma semana eu fiz uma úlcera no olho direito ao acordar. 

A partir desse dia e durante vários meses passei uma fase muito complicada, a ideia de fazer uma úlcera apenas porque abri as pálpebras gerou em mim uma grande insegurança e medo, passei dias a tentar estabelecer padrões que me possibilitassem ter um quadro de referência de causa-efeito, cujo resultado foi apenas a frustração de nada conseguir. Comecei a encurtar os períodos de sono à noite para tentar evitar as lesões recorrentes que fazia nas córneas, mas também não resultava. Os dias eram passados em casa a andar de um lado para outro com dores nos olhos, ou na melhor das hipóteses, picadas, ardor e sensação de corpos estranhos, para além de uma sensação contida de desespero. O tratamento continuava a ser a hidratação constante e o meu médico falou-me no tamponamento definitivo. Nessa altura, o médico explicou-me que eu tinha o sindroma de secura ocular grave e queratites devido a uma perda de sensibilidade nas córneas. Como no processo de cicatrização o epitélio não aderiu às partes profundas da córnea, a probabilidade de rasgar quando abria os olhos depois de horas de sono (durante o qual o olho seca mais) aumentava significativamente, o que me levava a ter erosões recorrentes.  

O meu médico continuava a dizer que não via motivos para que eu não ultrapassasse a situação, era tudo uma questão de tempo para que os tecidos nervosos afectados fossem recuperados, processo que podia demorar 2 a 3 anos, à excepção do funcionamento do sistema lacrimal, que ele já considerava difícil restabelecer-se para os níveis normais. Relativamente a tratamentos, o meu médico considerou que o mais apropriado era muita hidratação, os tampões e deixar o organismo fazer o resto. A sua atitude sempre foi firme no sentido de não utilizar antibióticos, cortisonas e muito menos analgésicos, à excepção de quando fiz as úlceras, altura em que tinha que usar lentes de protecção durante uns dias/semanas e em que as dores nos primeiros dias podiam ser (e foram) muito fortes. 

Este diagnóstico foi corroborado por mais dois médicos, que consideraram que, face ao estado das minhas córneas, talvez não fosse ainda de considerar terapias à base de corticosteróides, ou outras terapias mais recentes.

Em Janeiro, fiz o tamponamento definitivo e comecei a fazer uma dieta alimentar ligada à Macrobiótica com o objectivo de ajudar o processo de recuperação dos olhos e estabilização do sistema nervoso, factor este que o orientador alimentar considerou ser um ponto importante dado que a minha qualidade de sono era muito má há muito tempo e podia estar também a contribuir negativamente para a minha recuperação. No final desse mês, voltei a fazer outra úlcera no olho direito, tendo nessa altura o meu médico optado por me raspar o epitélio da córnea, o meu processo de cicatrização foi muito rápido, a córnea começou a ficar transparente e eu comecei a ficar um pouco confiante. Contudo o olho esquerdo continuava a ter pequenas erosões, eu estava a começar a dar sinais de muito cansaço e comecei a emagrecer significativamente (tendo atribuído este último facto à dieta que estava a seguir). 

Em Março, voltei a ter alergias nas pálpebras e inflamações nos olhos, o que me levou a estar ainda mais fechada em casa. Sentia que tudo era prejudicial, frio, vento, sol... escuso de frisar que televisão, computador, leitura foram actividades impossíveis de realizar desde Novembro, ou na melhor das hipóteses, em pequenas doses, nunca à noite e apenas nos dias em que me senti melhor. 

Por pressão de amigos, consultei mais dois médicos, um deles disse que o meu olho esquerdo nunca ficaria bom, apesar de ter admitido que não era especialista de córneas e um outro colocou a hipótese de eu ter acne rosácea. Nessa sequência, voltei ao dermatologista que sempre me acompanhou no processo a nível das alergias/eczemas das pálpebras, o qual não concordou com o diagnóstico, segundo a sua opinião os meus eczemas eram de contacto (excesso de gotas nas pálpebras e zona das pestanas, de estar constantemente a limpar com gazes as pálpebras, adicionado com poeiras da Primavera e/ou poluição citadina). 

Fiz análises para despiste de doenças auto-imunes (artrite reumatóide, sindroma de Sjorgen...), cujo resultado foi negativo, tal como o meu médico oftalmologista já previa, para ele a causa sempre foi a perda de sensibilidade das córneas. 

Em Maio, na sequência de uma infecção comecei a fazer erosões no olho esquerdo, tendo feito uma úlcera grande em extensão, o meu médico optou novamente por fazer a raspagem do epitélio, processo que tinha possibilitado a melhoria do olho direito (a córnea desse olho estava a ficar transparente e a visão estava bastante melhor), voltei ainda aos anti-histamínicos e a fazer novamente o tamponamento definitivo (pois tinha perdido os tampões). A recuperação foi também boa neste olho, apesar da visão do olho esquerdo ter ficado pior que no olho direito, pois parece que fiquei com uma marca cicatricial do pós-operatório. 

Entretanto, o meu médico optou ainda por começar a prescrever-me uma gota de cortisona ao deitar, para tentar estabilizar-me o sono, pois apercebeu-se que eu acordava todas as noites há mais de um ano, e desde Novembro em intervalos de 1, 1,5 e 2 horas nos dias melhores, e que isso estaria a dificultar a própria recuperação.  

A partir de Junho, comecei finalmente a melhorar de forma mais sustentada, quer dos olhos quer em termos de bem-estar geral (os quais nestes processos estão fortemente correlacionados! Para não dizer que são sinónimos) uns dias com mais ardor que outros e sempre atenta a qualquer sinal para desencadear acções protectoras, que mais não são que ficar em casa e hidratar agressivamente os olhos. Nessa altura comecei a descansar à tarde (meia hora a uma hora) e comecei a perceber que diminuía o desconforto e as picadas típicas do final do dia. Lentamente comecei a acordar não tão aflita e sobretudo a conseguir por o despertador para intervalos de 3 horas e meia a 4 horas. 

O meu médico falou-me num novo medicamento, que parece que teve alguns bons resultados ao nível do estímulo do sistema lacrimal, mas que é apenas comercializado nos EUA. Os esforços desencadeados para obter o medicamento, quer do meu médico quer meus, não surtiram ainda qualquer efeito, o que a mim, que passei pela crise e que continuo a correr riscos, considero no mínimo absurdo. Mas sobre o tema de medicamentos e apoios, haveria muito também para escrever, apenas comento que de facto não há de todo sensibilidade e até mesmo conhecimento dos efeitos destas patologias em termos da vida diária dos que dela padecem. A dada altura os meus olhos deixaram de suportar as gotas com conservantes, o que levou a que tenha que utilizar gotas e soro em unidoses. Para além da eventual toxidade dos conservantes nem todas as gotas permitem um alívio, por alguma razão que eu desconheço e julgo que os médicos em geral desconhecem, o que sei é que as gotas em unidoses, em geral, não são comparticipadas, o que leva a gastos mensais francamente elevados, no meu caso os meus gastos médios mensais variam entre os 400 a 300 euros, montante impossível de sustentar para muitas pessoas, pelo que não posso deixar de colocar a questão que alternativas teriam, hidratar menos as córneas, colocar gotas que acabem por também ser agressivas para os olhos? E os resultados a prazo na saúde das córneas, a qual já está suficientemente comprometida?! Para não falar das conversas nos centros de saúde onde parece existir uma dúvida, mais ou menos subtil, sobre o sofrimento que temos. 

Voltei a trabalhar nos finais de Agosto, em regime de meio-dia no escritório, meio-dia em casa e sem esforçar demasiado os olhos no computador. Como o meu trabalho é exigente a esse nível, escuso de dizer que as limitações de saúde ocular podem ter consequências negativas ao nível profissional. De qualquer modo, tento pensar que ainda que os meus olhos oscilem entre fases mais e menos positivas, considero que têm vindo gradualmente a melhorar, o que me permite ir também gradualmente libertando a tensão emocional e física que acumulei durante esta fase. 

Hoje, passado 1 ano e 9 meses da crise e dois anos e 3 meses da operação, posso dizer que estou melhor, contudo tenho uma insuficiência lacrimal crónica com implicações na vida quotidiana, incluindo a profissional e que exige um acompanhamento médico, uma hidratação constante dos olhos e o uso regular de corticosteróides, bem como a ter várias limitações: não posso viajar de avião por tempo indeterminado, trabalho no escritório apenas meio-dia, reduzo a leitura ao máximo, assim como televisão, ainda não voltei ao cinema ou teatro, quase não frequento espaços fechados (escuso de comentar o efeito que o tabaco provoca!), resumindo “poupo as córneas” para trabalhar! Para além disso, continuo a hidratar agressivamente os olhos (hoje já consigo fazer intervalos de 1 a 1,5 hora e meia e durante a noite de 4 horas), a colocar a gota de cortisona e fazer descansos ao longo do dia. Relativamente a consequências práticas e mais ou menos estruturais: mudei o regime alimentar como forma de tentar que o organismo esteja o mais equilibrado possível, tento reinventar os meus hobbies e métodos de trabalho de forma a reduzir o esforço dos olhos, e tudo o que possa ter um impacto ao nível das córneas, e por fim ou sobretudo, tento aprender a gerir o receio de viver tudo novamente acrescido do cansaço de mais um retrocesso.

 

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